segunda-feira, 11 de setembro de 2023

Kyra Kyralina

 

Kyra Kyralina
Panait Istrati

Tradução e apresentação de Aníbal Fernandes

ISBN 978-989-568-041-2 | EAN 9789895680412

Edição: Agosto de 2023
Preço: 14,15 euros | PVP: 15 euros
Formato: 14,5 × 20,5 cm (brochado, com badanas)
Número de páginas: 160

Roman Rolland: «É um contador de histórias do Oriente que encanta e se comove com as suas próprias narrativas; e de um tal forma se prende a elas, que uma vez começada a história ninguém sabe, nem ele próprio sabe, se vai durar uma hora ou mil e uma noites.»

 

O mais significativo resultado de tudo isto deu-se em 1924 — o ano em que André Breton publicava Les Pas perdus, Raymond Radiguet surgia com o póstumo Le Bal du comte d’Orgel, Jean Cocteau com Le Grand écart e Jean Giraudoux com Juliette au pays des hommes — quando um desconhecido com estranho nome a soar muito a romeno, mas a mostrar que escrevia em francês, ofereceu ao público uma sedutora história de orientalismos que se chamava Kyra Kyralina. Dois anos antes, este Istrati já tinha quatro obras terminadas — Oncle AnghelKir NicolasSotiz e Mikhail — mas o seu «mestre» preferiu-o na estreia literária com esta outra, mais recente e perturbante — que acrescentava ao nome de uma mulher o seu diminutivo — a que surgiu em 1923 na revista Europe e um ano depois em livro e prefaciada por Romain Rolland:

«Nos primeiros dias de Janeiro de 1921, foi-me entregue uma carta que vinha do Hospital de Nice. Tinha sido encontrada no corpo de um desesperado que acabava de dar um golpe na garganta. Havia poucas esperanças de que ele sobrevivesse ao ferimento. Li-a e fui invadido pelo tumulto do génio. Um vento que queimava na planície. Era a confissão de um novo Gorki dos países balcânicos. Conseguiram salvá-lo. Eu quis conhecê-lo. Encetámos uma correspondência. Ficámos amigos.»

[…]

A surpresa de Kyra Kyralina animou um editor a fazer o contrato que deu a conhecer poucos meses depois Oncle Anghel Présentation des Haïdoucs. E em 1927 a Nouvelles Littéraires já se interessava por ele como entrevistado.

[…]

Morreu em 16 de Abril de 1935. Tem uma lápide no cemitério de Bellu, em Bucareste, aonde foi parar sem serviços religiosos. A sua fama política incomodava a ortodoxia romena. Tinha escrito Em Direcção a Outra Chama? Sim, mas era ainda assim «um comunista».

[Aníbal Fernandes]

Codine

 

Codine
Panait Istrati

Tradução e apresentação de Aníbal Fernandes

ISBN 978-989-568-040-5 | EAN 9789895680405

Edição: Agosto de 2023
Preço: 12,26 euros | PVP: 13 euros
Formato: 14,5 × 20,5 cm (brochado, com badanas)
Número de páginas: 96



Codine, transformado no fora-da-lei por um sentimento cheio de violência contra a injustiça dos homens. Adrien, um apaixonado aprendiz do seu desiludido conhecimento dos males do mundo. Um estranho, incómodo e radical conceito do amor-amizade.

 



Os títulos do Istrati ficcionista vão aparecendo com uma imperturbável regularidade. Constroem aos poucos uma disfarçada autobiografia onde teremos de destrinçar o realmente vivido do literariamente contado, e que se divide em várias secções. As Narrativas de Adrien Zograffi incluem Kyra KyralinaO Tio AnghelApresentação dos Haiduques e Domnitza de SnagovA Infância de Andrien Zograffi inclui CodineMikhailAs Minhas Partidas e os contos de O Pescador de EsponjasA Vida de Andrien Zograffi inclui A Casa Thüringer, A Agência de EmpregosMediterrâneo. Fora deste extenso zograffismo está um dos seus romances mais célebres (Os Cardos do Baragan) que as memórias da sua vida inspiram mas escapa à presença explícita do Istrati-Zograffi.

[…]

Panait Istrati conviveu com Codine cerca de cinco anos, desde 1891 a 1896, ou seja, desde os seus sete aos doze anos de idade. E a passagem a literatura desta apaixonada admiração põe-nos perante um estranho, incómodo e radical conceito de amizade. Nas histórias de Adrien Zograffi, a amizade tem um papel importante; é o mais profundo dos sentimentos, aquele que ultrapassa todos os outros, incluindo o do amor sensual. Deste amor sensual há a mais explícita das confissões quando escreve em NarrantsoulaAmo no homem o que ele transporta consigo desde que nasce, o amor-amizade. Amo a mulher quando o seu sangue está abrasado pela paixão carnal. Entrego-me a eles sem condições, com frenesi. Isto custa caro, mas as decepções que sofri nunca me decepcionaram, nunca diminuem a soma dos meus desejos.

Na sua obra há a história de duas amizades masculinas que se destacam por uma brutal violência de sentimentos.

[Aníbal Fernandes]

Constelações — Ensaios sobre Cultura e Técnica na Contemporaneidade

 

Constelações — Ensaios sobre Cultura e Técnica na Contemporaneidade
José Bragança de Miranda


ISBN 978-989-8833-91-4 | EAN 9789898833914

Edição: Abril de 2023
Preço: 18,87 euros | PVP: 20 euros
Formato: 16 × 22 cm (brochado, com badanas)
Número de páginas: 272

Com o apoio do Instituto de Comunicação da Nova 



Um livro deve tudo aos que ajudaram a arrancá-lo ao grande exterior, seja ele o nada ou o real. Agora que o devolvo aos meandros de onde proveio, escavados por todos sobre a superfície da Terra, talvez mais um sulco, ou alguma água desviada, quero agradecer àqueles que me ajudaram a fazer este retraçamento do caminho feito nestes anos de crise, pouco propícios para a escrita. […] Dá-me alegria o número daqueles a que precisei de agradecer. Se morremos sozinhos, mesmo que sejam sempre os outros que morrem — é esse o epitáfio escolhido por Duchamp —, só vivemos bem em companhia.

 



Estes ensaios foram escritos sob a imagem da constelação. Controlada pelo conceito, com as novas máquinas como a da fotografia, a imagem libertou-se, separou-se dos objectos que a aprisionavam, eles próprios prisioneiros da lógica da rendibilidade. Uma nova plasticidade é produzida pelas imagens, que na sua leveza e movimento arrastam, com leveza e sem violência, o real. O pensamento do século XX propôs uma outra configuração do pensar pela imagem, desenvolvendo métodos como os de mosaico, de caleidoscópio, de paradigma, de mapa, de atlas, de arquivo, de arquipélago, e até de floresta ou de montanha, como nos ensinou Aldo Leopoldo. Esta nova semântica da imagem, depois de milénios de destituição pelo platonismo, significa estar à escuta da máxima de Giordano Bruno de que «pensar é especular com imagens».

 

Em suma, a constelação em acto neste livro é magnetizada por uma certa ideia da técnica enquanto acontecimento decisivo, e cada ensaio aqui reunido corresponde a uma refracção dessa ideia num problema por ela suscitado, passando pela arte, o corpo, a fotografia e a técnica propriamente dita. Tem como único objectivo que um certo pensar se materialize, que este livro o transporte consigo e, seguindo o seu curso, encontre os seus próximos ou não.

[José Bragança de Miranda]

Oscilações (poesia em todos os sentidos)

 

Oscilações (poesia em todos os sentidos)
Joana Matos Frias


ISBN 978-989-8834-53-9 | EAN 9789898834539

Edição: Julho de 2023
Preço: 22,64 euros | PVP: 24 euros
Formato: 14,5 × 20,5 cm (brochado, com badanas)
Número de páginas: 344

Com o apoio do Instituto de Literatura Comparada Margarida Losa



A razão pela qual são estes os ensaios que compõem esta colectânea, e não os vários outros que de momento ficam de fora, […] resulta de um certo tipo de sobressalto insistente e persistente, que por isso mesmo é transversal a todas as reflexões.




Os textos aqui reunidos foram pensados e escritos, nas suas primeiras versões, ao longo de cerca de duas décadas, em momentos e circunstâncias distintos, que poderão ser reconstituídos a partir das informações incluídas no final do volume. Mas isso não significa que a sua reunião neste livro represente apenas um aglomerado de artigos sem qualquer relação entre si para além da comum autoria. Muito pelo contrário. A razão pela qual são estes os ensaios que compõem esta colectânea, e não os vários outros que de momento ficam de fora, é que a problematização que em cada um deles é levada a cabo — malgrado a diversidade dos autores e das obras lidos e comentados — resulta de um certo tipo de sobressalto insistente e persistente, que por isso mesmo é transversal a todas as reflexões.

Em certa medida, esse sobressalto é equacionável a partir de uma sequência de incertezas que foram suscitadas por alguns autores que têm acompanhado as minhas leituras nos últimos anos e que, embora possam não ser explicitamente citados ao longo das próximas páginas, subjazem a uma parte muito considerável delas. Oriundos de tempos e espaços bastante díspares, encontro sempre em todos eles motivos maiores de desassossego. Falarei com brevidade desses motivos, esperando que de alguma forma este comentário preliminar possa preparar a leitura orgânica daquilo que se segue.

[Joana Matos Frias]

 

AUTORES REFERIDOS

António Franco Alexandre / Ana Luísa Amaral / Fiama Hasse Pais Brandão / Rui Pires Cabral / Armando Silva Carvalho / Vergílio Ferreira / Manuel de Freitas / Marília Garcia / Théophile Gautier / Nuno Guimarães / Herberto Helder / Rui Lage / Albano Martins / Murilo Mendes / João Cabral de Melo Neto / Alexandre O’Neill / Luís Quintais / António Ramos Rosa / Mário de Sá-Carneiro / Alexander Search / José Miguel Silva.

A Experiência Sonora — Da Linearidade à Circularidade

 

A Experiência Sonora — Da Linearidade à Circularidade
Adriana Sá, António de Sousa Dias, David Novack, Gonçalo Gato, João Manuel Marques Carrilho, Luís Cláudio Ribeiro, Mohammed Boubezari, Raquel Castro

Coordenação e introdução de Luís Cláudio Ribeiro

ISBN 978-989-568-065-8 | EAN 9789895680658

Edição: Abril de 2023
Preço: 16,98 euros | PVP: 18 euros
Formato: 16 × 22 cm (brochado, com badanas)
Número de páginas: 240

Com o apoio do CICANT



Quer organicamente quer estruturalmente nada no som deve remeter para uma representação ou uma materialidade. Assim sendo, o som acarreta uma orfandade e como tal tem apenas como indicação poisar-nos no mundo.

 



Há uma ideia muito antiga, tão antiga como o humano, que quer reunir o som com uma fonte, um som que traz no seu rastro uma figura ou imagem. Esta matriz é também a origem de uma enigmática sensação: o som no nosso ouvido abre os olhos a uma fonte, possível origem desse som. O som traz consigo uma figura muda que quer ser revista. Mesmo já perdida a fonte, o cérebro quer saber a sua origem. Esta situação ocorre quando não há media de produção que alteram a matriz sonora. Neste caso, o som, pensemos no processo electrónico, é apenas o vestígio que quer fazer a sua própria representação.

Agora pensemos que quer organicamente quer estruturalmente nada no som deve remeter para uma representação ou uma materialidade. Assim sendo, o som acarreta uma orfandade e como tal tem apenas como indicação poisar-nos no mundo. Ele não quer ser mais do que as fundações de uma habitação ou uma moradia que torne possível uma existência plena, o melhor sensível dessa existência, que se revela no som como ponte e passagem para uma sintonia eficaz com o mundo. E essa «apresentação» não provém de uma significação, é apenas um efeito que pode ser diverso em cada indivíduo.

[…]

Quando em 2011 iniciámos o projecto «Lisbon Sound Map» tínhamos como primeiro objectivo fazer um levantamento do mapa sonoro de Lisboa, sobretudo das áreas que estavam a sofrer alterações, seja na sua população residente, seja na construção. Este mapa sonoro é hoje importante para se entender as alterações dos fluxos e paisagens sonoras da cidade nesta última década.

[…]

O conjunto dos eventos realizados em diferentes lugares da cidade e na universidade, sob proposta dos membros do projecto, possibilitam essa reflexão, que aqui se apresenta em capítulos que desejam desenvolver as relações da audição e do som com o meio envolvente e com a produção sonora para os media e as artes. Aprofundar estas relações tornou-se hoje numa urgência que os investigadores editados neste livro aceitaram.

[Luís Cláudio Ribeiro]

Pedras e Batatas / O Ruído dos Sonhos

Pedras e Batatas / O Ruído dos Sonhos
Miguel Ângelo Rocha, com Isabel Madureira Andrade e Russell Floersch

Textos de Maria João Gamito e Ricardo Escarduça
Design gráfico de Atelier Pedro Falcão

ISBN 978-989-568-097-9 | EAN 9789895680979

Edição: Abril de 2023
Preço: 28,30 euros | PVP: 30 euros
Formato: 21 × 28 cm (encadernado, com tela serigrafada)
Número de páginas: 196 (a cores)

Com a Galeria 111 e o Círculo de Artes Plásticas de Coimbra

Edição bilingue: português-inglês


Miguel Ângelo Rocha: «Este livro apresenta um projecto em dois momentos (duas exposições): Pedras e Batatas, na Galeria 111, Lisboa, e O Ruído dos Sonhos, no CAPC (Sede e Sereia), Coimbra. Para a exposição no CAPC, convidei os artistas Isabel Madureira Andrade e Russell Floersch. O envolvimento destes artistas, assim como as suas obras, completam o projecto.»

 


Na exacta irregularidade da forma que, recortada em papel branco, ocupa quase um terço da margem inferior do desenho/colagem, uma seta põe em contacto um título — Stones and Potatoes — e os registos sobrepostos em que, da leitura, julgamos reconhecer uma pedra e uma batata. Neste sentido, vinda das palavras, a seta aponta para as imagens sugerindo aos olhos a direcção que as concretiza como figuras prováveis da estabilidade semântica conferida por um título.

Mas se ignorarmos essa direcção e começarmos por nos deter na improbabilidade das figuras, apenas duvidando das palavras — já não título mas legenda — nos podemos aproximar da observação do seu movimento, considerado por Miguel Ângelo Rocha um programa de desobediência. E se, à partida, o movimento resulta tanto da obra a fazer-se como do seu continuado devir, a desobediência é a condição que nela inscreve as múltiplas divergências que comprometem a imobilidade das palavras, das imagens e dos objectos, mantendo intacto o rigor da sua presença.

[Maria João Gamito]


Sem adoptar o plano de uma exposição colectiva, em O Ruído dos Sonhos, Miguel Ângelo Rocha, Isabel Madureira Andrade e Russell Floersch encontram-se, como se um mistério gravítico, algum ímpeto magnético que habite e agite o seu interior e, contudo, não dominam nem de que tomam posse, os atraia, e, enfim, revele o invariante que eclode do particular. […] O Ruído dos Sonhos é uma manifestação de Formas, contêm ideias, porém alheias à metafísica. São coisas, matérias e formas imediatas, sem idealismo ou intangibilidade.

[Ricardo Escarduça]

Itinerário e Transmissão

 

Itinerário e Transmissão
Pedro Tropa

Textos de Sérgio Mah e Pedro Tropa
Design gráfico de Atelier Pedro Falcão

ISBN 978-989-568-095-5 | EAN 9789895680955

Edição: Maio de 2023
Preço: 14,15 euros | PVP: 15 euros
Formato: 17 × 24 cm (brochado)
Número de páginas: 120 (a cores)

Com a Galeria Quadrado Azul

Edição bilingue: português-inglês



Sérgio Mah: «Esta publicação reúne um conjunto de trabalhos realizados nos últimos anos e tem como elemento aglutinador o som.»

 



No início, tive de me debater com o problema de o desenho ser um processo, em certa medida, conflituoso com o processo fotográfico, criando algumas discrepâncias e por vezes algumas inversões. A fotografia trata, é claro, do tempo objectivo, do testemunho e frontalidade que eu sempre achei muito transparente. O desenho, por outro lado, tem um curso que, longe de ser apenas uma dimensão linear, vai abrindo formas que estão mais perto das ideias das coisas do que das próprias coisas. Este conflito fez-me interessar pelas matérias sonoras, gravadas ou sintetizadas, que possuem esta dualidade de registo sensorial (ausente na fotografia) e ao mesmo tempo propensas a processamentos e transformações, como no desenho. Penso, sobretudo, o som como outra imagem e como outra forma de representação.

[Pedro Tropa]

 

Desde o início da sua trajectória artística, em meados dos anos 1990, que o trabalho criativo de Pedro Tropa tem privilegiado temas imanentes à experiência e percepção da paisagem. A vivência de lugares concretos ou arquetípicos (pelas suas ressonâncias poéticas ou simbólicas, como a montanha, a lagoa, a ilha), as sensações do corpo perante certas condições topográficas e meteorológicas, ou simplesmente as dinâmicas que o olhar incorpora diante de certos territórios, têm sido insistentemente reconfigurados pelo artista através da observação testemunhal proporcionada pela fotografia ou mediante uma prática do desenho, desenvolvida no espaço do atelier, que articula as especificidades desse processo criativo com a memória dos lugares.

Nos últimos anos, o trabalho de Pedro Tropa alargou-se a outros meios de expressão como a escultura, a poesia e o som. Neste contexto, é de destacar o uso do som, pensado não apenas como um meio, mas fundamentalmente como uma vasta zona de assuntos, ideias e imagens, através do qual o artista congemina inúmeras e fecundas combinações estéticas e especulativas entre os diferentes meios e os temas da paisagem.

[Sérgio Mah]

Poema

 

Poema
Tomás Maia

Em colaboração com Alessandra Salvini, André Maranha e Paulo Sarmento
Textos de Federico Ferrari e Isabel Santiago
Fotografias de André Maranha e Diogo Saldanha
Versão cinematográfica de Pedro Florêncio

ISBN 978-989-568-098-6 | EAN 9789895680986

Edição: Junho de 2023
Preço: 12,26 euros | PVP: 13 euros
Formato: 14,5 × 20,5 cm (brochado, com badanas)
Número de páginas: 92 Com a DGArtes



Uma peça que procura mostrar o gesto criador, ou poiético.

 



Poema

(para uma mulher e cerca de 20 caminhantes, distribuídos equitativamente por dois grupos; duração aproximada: entre 20 a 30 minutos; local: cisterna do Convento de São Francisco, Lisboa)

 

[sinopse]

Uma peça que procura mostrar o gesto criador, ou poiético: daí o seu título, Poema, que não designa aqui uma composição literária nem tão-pouco escrita, mas toda e qualquer coisa que resulta da poiesis. A apresentação visual, aliás, não fará recurso à palavra, sendo apenas inicialmente pontuada por uma elementar percussão (utilizando a terra como instrumento de ressonância, e obedecendo a um ritmo irregular).

poiesis é apresentada num duplo movimento, de fluxo e de refluxo, descendente e ascendente, numa velada revisitação do mito de Orfeu — mas retirando ao mito a figura masculina (e, portanto, qualquer heroísmo) e transformando Eurídice na própria poesia que, diferentemente dos mortos, se eleva acima do mundo subterrâneo.

[Tomás Maia]

 

São mortos que descem para o abismo. São amorfos, sem cor, nada têm senão o seu próprio olhar, mas voltado para baixo. O passo é incerto, um pouco desajeitado. Onda informe que avança segundo a necessidade, segundo a gravidade. Mais do que caminharem, inconscientemente caem, precipitam-se, inexoravelmente são arrastados, com regularidade, para um não-lugar, para o nada.

[Federico Ferrari]

 

Desaparece a ressonância do som. Desaparece o estertor que tocava o corpo da parede da cisterna até ao nosso. Está escuro. Está silêncio. Há uma pausa. Continuamos sem espaço e sem tempo. Então, a luz. A luz reabre um espaço. O espaço forma-se. Cria-se diante de nós. Procuramos, no âmago do desconhecido, um nome para o dizer. Nomear. É um novo antigo. A luz traz o antigo, muito antigo, até ao instante. Só há instante. Aquele.

[Isabel Santiago]

O Raio a Cabeça o Trovão — Escultura

 

O Raio a Cabeça o Trovão — Escultura
Manuel Rosa

Texto de Sousa Dias
Edição de Tomás Maia

ISBN 978-989-568-096-2 | EAN 9789895680962

Edição: Maio de 2023
Preço: 14,15 euros | PVP: 15 euros
Formato: 14,5 × 20,5 cm (brochado)
Número de páginas: 48 (a cores)
Com a Galeria Neupergama



De que idade do mundo, e de que idade da arte, vêm estas esculturas? Evidência imediata: não desta época, não do presente. Nem da presente realidade do mundo nem do presente estado da arte.



 

O presente livro foi publicado por ocasião da exposição Manuel Rosa — Escultura, realizada na Galeria Neupergama (Rua Serpa Pinto 10, 2350-552 Torres Novas), de 10 de Dezembro de 2022 a 20 de Maio de 2023, e constitui uma homenagem do artista a Mário Cesariny no centenário do seu nascimento.

 

A arte de Manuel Rosa: uma arte, como afirma Tomás Maia, «sem idade». Uma arte que «não acompanha o fim da arte, não prolonga a religião da arte». Mas que também não prolonga, no presente, a religiosidade, a simbologia religiosa, dos modelos originais inspiradores, da arte antiga. Não há nada de religioso, nenhuma referencialidade ao sagrado, nenhuma reminiscência sacra, nestes objectos escultóricos. Certo que eles evocam uma idade, ou idades, da arte em que esta não existia separada da religião, de uma forma pagã qualquer de sacralidade. Só que perderam, entretanto, para nós, essa irrecuperável vinculação semântica, semio-ontológica, dos seus modelos primitivos. Surgem-nos desnudados, obliterados desse sentido, despojados dessa sobredeterminação primeva da vontade estética. Ao mesmo tempo nem do seu tempo e do seu mundo histórico (antiguidade) nem deste tempo e desta idade da arte (contemporaneidade), estes objectos desarmam-nos, perturbam-nos, questionam a nossa ideia contemporânea de arte. A evidência desta escultura neo-arcaica, ou neo-primitiva, manifestamente anacrónica, não é a de uma geminação essencial nativa do estético e do sagrado mas, insistimos, a de uma co-originaridade espiritual da arte e do humano.

[Sousa Dias]