terça-feira, 21 de julho de 2020

O Colóquio dos Cães incluído em O Casamento Enganoso I Miguel de Cervantes


O Colóquio dos Cães incluído em O Casamento Enganoso
Miguel de Cervantes

Tradução e apresentação de Aníbal Fernandes

ISBN 978-989-8833-49-5 | EAN 9789898833495

Edição: Julho de 2020
Preço: 11,32 euros | PVP: 12 euros
Formato: 14,5 x 20,5 cm (brochado, com badanas)
Número de páginas: 128



Cervantes: «Sou o primeiro a fazer novelas em língua castelhana, porque as muitas novelas que nela andam impressas são todas traduzidas de línguas estrangeiras, e estas são minhas, não imitadas nem furtadas; o meu engenho engendrou-as e pariu-as a minha pena, e vão crescendo nos braços da imprensa.»


Se Miguel de Cervantes no teatro mostrava um talento suplantado por Lope de Vega, se em versos nunca era mau sem ser muito bom, surgiu como fulgurante inovador da ficção em prosa, considerada no seu tempo arte menor perante as formas poética e teatral. O seu D. Quixote conquistou no mundo literário um primeiro e bem explícito exemplo do que hoje conhecemos pela designação de romance; e as suas ficções curtas — só antecedidas no género pelas que tinham construído o Decameron de Bocaccio — também se afirmavam em castelhano como novidade absoluta.
[…] Estas ficções curtas, escritas em épocas diferentes da sua vida, foram revistas e sujeitas à forma definitiva que assumiram para surgir reunidas nas suas Novelas Exemplares publicadas em 1613, três anos antes da sua morte.
São doze, se incluirmos nelas o exemplo discrepante de O Colóquio dos Cães, metido dentro de outro texto, O Casamento Enganoso, este conciliável com o que reconhecemos como novela. O incómodo estrutural desta discrepância já excluiu por várias vezes o Colóquio do conjunto destas novelas, mesmo que tenha sido preciso amputar com ele a parte final de O Casamento Enganoso.
Cervantes, por certo inspirado num diálogo do grego Luciano de Samósata com animais dotados de racionalidade, dá a dois cães algumas horas de fala e superior entendimento, para oferecer aos seus leitores um espectáculo de males muito difundidos na sociedade do seu tempo e perturbadores do comportamento moral que uma inocência de cão julgaria inseparáveis da raça humana. O prodígio mental concedido ao cão Berganza permite que ele nos dê conta, de forma irónica e por vezes pícara, das experiências que teve com todos os seus donos, ouvido atentamente pelo cão Cipión, que ao ser abrangido pelo mesmo prodígio decide retribuir-lhe com outro relato. Cervantes teria pensado em duplicar este diálogo de cães, sem nunca chegar a fazê-lo, promessa não cumprida que incitou um tal Ginés Carrillo Cerón, escritor de Granada, a publicar em 1635 Los Perros de Mahudes, executando o que Cervantes prometeu mas nunca realizou. 
[Aníbal Fernandes]

Entre a Espada e a Parede — Diário de um assassino I Tristan Bernard



Entre a Espada e a Parede — Diário de um assassino
Tristan Bernard

Tradução e apresentação de Aníbal Fernandes

ISBN 978-989-8833-50-1 | EAN 9789898833501

Edição: Julho de 2020
Preço: 13,21 euros | PVP: 14 euros
Formato: 14,5 x 20,5 cm (brochado, com badanas)
Número de páginas: 160



Não sinto remorsos. Se tenho qualquer coisa contra mim, não é ter matado. O que eu sinto é pena por ter envenenado a minha vida com esta ameaça de prisão.


Mas este «teatral» Tristan Bernard também escreveu romances, na maior parte defendidos da sua fulgurante veia humorística; inesperadas ficções que saíam de outro tom — por vezes amargo e sem nada que o ligasse ao que pontualmente se lia, caucionado pelo seu nome em páginas de revistas e jornais. Foi a sobrevoar esta segunda onda que Bernard, aos sessenta e sete anos de idade, publicou Aux abois (Entre a Espada e a Parede), o seu mais talentoso romance, como já é reconhecido por essa lucidez que a passagem do tempo — a grande varredora de glórias efémeras momento a momento construídas — concede ao julgamento desembaraçado dos compromissos e amiguismos que condicionam com tanta frequência a decisão crítica.

Tem-se dito que Entre a Espada e a Parede é um inegável devedor do Crime e Castigo de Dostoiévski, o mais célebre exemplo literário do acto assassino desmotivado […]; também se diz que foi inspirador do eixo central de L’Étranger de Albert Camus, embora não se conheça uma palavra deste autor que permita dar como firme uma tal filiação.
No que toca a Dostoiévski, depois de alguma semelhança entre os crimes frios do seu Raskolnikov e o deste Duméry, tudo é diferente porque o assassino russo se prolonga numa implacável peregrinação expiatória, enquanto o assassino de Aux abois vive numa ausência de sensação de culpa, numa entrega passiva e com qualquer coisa de entediada aos prazeres que a sua desenvolta situação financeira lhe proporciona.
Duméry está bastante mais próximo do Mersault de Camus; há nas duas narrativas uma história de tempo interior com sucessivas emoções a determinarem a forma como esse tempo se reflecte no tempo exterior; a personagem de Camus não sente, como a de Bernard, remorsos que lhe alterem a energia dos actos de vida, apenas lamenta as consequências práticas — os incómodos da ocultação, a fuga à Justiça — que lhe perturbam a comodidade do quotidiano. Serei ou não uma criatura abominável?, é aqui a crucial interrogação. Não é a pergunta que devo fazer. Verifico isto: não sinto remorsos. Se tenho qualquer coisa contra mim, não é ter matado. O que eu sinto é pena por ter envenenado a minha vida com esta ameaça de prisão.
[Aníbal Fernandes]

Manuel Amado — Pintura sem álibi



Manuel Amado — Pintura sem álibi
Manuel Amado

Textos de Bruno Munari, Joana Amado, Mariana Pinto dos Santos e Vitor Silva Tavares

ISBN 978-989-9006-38-6 | EAN 9789899006386

Edição: Junho de 2020
Preço: 28,30 euros | PVP: 30 euros
Formato: 24 x 28 cm (brochado, com badanas)
Número de páginas: 152 (a cores)

Com a Fundação Arpad Szenes – Vieira da Silva
Edição bilingue: português-inglês




Joana Amado: «O meu pai gostava de rever, de reler, de reouvir, de reviver, de reencontrar, de recomer, de rebeber e de reamar. Adorava pintar e repintar.»



A Manuel Amado não interessou o diálogo com a arte de artistas seus contemporâneos, independentemente de admirar muitos deles e ter relações de grande amizade com alguns. Disse ele: «Nunca fui sensível a fazer o que a geração me pedia. A uma geração que me era hostil. Hostil à minha maneira de pintar.» Existe alguma coisa delicadamente bartlebyana nesse preferir não fazer o que podia ser esperado, não cumprir os requisitos para entrar na arena dos debates da arte contemporânea. A hostilidade de que falava Manuel Amado teria por certo que ver com a escolha por fazer uma pintura realista, recuperando uma função de representação com a qual a arte contemporânea entrara em ruptura há muito. No entanto, a representação em Manuel Amado é de um realismo apenas aparente. O que está na tela são construções de memória, não correspondem senão a um real imaginado, recordado, sem reconstituição possível. E por isso este realismo está longe de ser fotográfico.
[…] A pintura é assim, em Manuel Amado, um mecanismo para parar o tempo. Parar o tempo presente, e também o tempo onírico da memória, o tempo imaginário, cinematográfico, o da sala de cinema, onde há um corte momentâneo, mas total, com o tempo real deixado em pausa do lado de fora. Nesse lugar é possível evocar as imagens dos espaços onde o tempo já decorreu, ou pode decorrer, desfazendo a cronologia. O que se vê de longe, como diz o pintor, são as imagens de rememoração, fantasmáticas. Nelas está latente a experiência ou a acção, mas cristalizadas, entre respirações. A inquietação será essa, a de respiração em suspenso. 
[Mariana Pinto dos Santos]


Gosto dos quadros do Manuel por tudo o que não se vê, mas que se sente, se intui que está nestas pinturas. 
[Bruno Munari]


Não sobeja parte de casa para confidências ou leituras paralelas: exacta, nítida, esta pintura manifesta-se ao olhar em seu paciente artesanato. É o que é — o real na pintura ou a pintura sem álibi.
[Vitor Silva Tavares]

Nikias Skapinakis — Paisagens (2018-2020) I Bernardo Pinto de Almeida



Nikias Skapinakis — Paisagens (2018-2020)
Bernardo Pinto de Almeida

ISBN 978-989-9006-40-9 | EAN 9789899006409

Edição: Junho de 2020
Preço: 15,09 euros | PVP: 16 euros
Formato: 17 x 22 cm (brochado, com badanas)
Número de páginas: 128 (a cores)

Com a Galeria Fernando Santos
Edição bilingue: português-inglês



Paisagens desabitadas, crepusculares que se esvaziaram de toda a presença humana para acolherem apenas, no seu locus desabitado, o olhar e espanto de quem as olha.



Agora, com esta nova série, Preto e Branco — que julgo, sem qualquer reserva, ser a mais radical e extrema a que o artista chegou, na incansável busca de levar sempre mais longe e adiante os pressupostos da obra, esclarecendo através de cada uma o sentido profundo de quanto a precedeu — aquele que, porventura, foi um dos mais fulgurantes e ricos coloristas da arte portuguesa do passado século, surpreende-nos de novo, e muito, ao trazer-nos, inesperadamente, uma pintura cujas cores repousam, já, todas secretamente ocultas, fechadas dentro do seu espesso e inexorável negro. Um negro que, diremos ainda, se adensa como se para anunciar a obscuridade destes novos tempos que enfrentamos, e no qual se dissolve, como se numa noite escura, tudo quanto julgávamos saber.
Um negro (que aqui se mostra, enfim, na evidência de ser a síntese extrema de todas as demais cores) que se expande vorazmente pela tela, que a risca, invade, mancha, a povoa tal qual as cores mais vivas o fariam, mas sem que por isso jamais se deixe cair na tentação de servir como desenho, ou como ser gráfico, portador, como tal, de uma qualquer forma de escrita ou de sinal, nem de um qualquer desejo de se prender no plano do esboço, sequer no que seria da ordem de uma síntese poderosa manifestada num esquisso. […] A arte de Nikias, sempre distanciada e grave, irónica por vezes na sua distância, nada tem de melancólico. E tal como esses animais que, com leveza, por sucessivas mutações vão deixando para trás a pele que os identificava, e assim se transfiguram, também esta pintura uma vez mais se transfigura diante dos nossos olhos, e se faz outra do que foi, sem por isso deixar de se ligar com toda a sua memória.
[Bernardo Pinto de Almeida]


Desenvolvidas entre 2018 e o presente, as Paisagens a Preto e Branco pertencem à série Paisagens Ocultas, das quais conservam os sete planos que estruturam a composição e a sinuosidade da linha; substituem, porém, o cromatismo (que identifica a maioria dos períodos do meu trabalho) por um monocromatismo que utiliza o preto (ivory black), aplicado sobre a tela em sucessivas camadas de diferentes densidades.
O branco mais luminoso é, assim, o próprio branco da tela, onde as nuances substituem as cores lisas que caracterizam as Paisagens Ocultas.
[Nikias Skapinakis]

Pedro Saraiva > gabinetes I Maria João Gamito



Pedro Saraiva > gabinetes
Maria João Gamito

ISBN 978-989-9006-37-9 | EAN 9789899006379

Edição: Junho de 2020
Preço: 22,64 euros | PVP: 24 euros
Formato: 17 x 23 cm (brochado, com badanas)
Número de páginas: 376
Com a Fundação Carmona e Costa  e o 
CIEBA – Centro de Investigação e de Estudos em Belas-Artes




> gabinetes é, portanto, o encerramento provisório de uma causa por concluir. Voo ou queda — e não importa o quê porque de ambos só assistimos ao arrebatamento de tudo o que, na duração que lhe é consentida, resiste ao poder infalível da gravidade —, o desígnio é o da oposição, mas de uma oposição pretendida no que de mais fundamental nos consente no mundo e nele nos situa entre os seres e as coisas que se nos opõem, por ser essa a condição do que só pode existir fora de nós.



> gabinetes é o título da exposição que encerra o projecto homónimo iniciado por Pedro Saraiva em 2008 e que, ao longo de dez anos, pôs em contacto Cristina Rosa Agostinho, dita a ‘Linfa’, (1912-1973), Manoel Celestino Alves, ‘o Dr. Cambedo’, (1912-1990), Alberto Maria de Oliveira Bárcea (1908-1978), António Rodrigues Carrera (1900-1948), António Maria Codina (1896-1954), João Gregório (1884-1964), Manuel dos Prazeres Dias Linares (1898-1968), Francisco José Martins, mais conhecido por ‘Panero’, (1895-1955), Musad Maïga (1952-2017) e Pedro Saraiva (1952). Eles são o álibi das obras e os nomes que, através de fragmentárias biografias, consubstanciam os espólios, visíveis em cada exposição sob a designação do gabinete que os identifica.
> gabinetes constitui o ensaio geral das exposições que paradoxalmente tiveram lugar antes dele e cujos despojos se acumulam no avesso das paredes do gabinete > saraiva, núcleo irradiante da exposição e lugar íntimo — lugar dentro de lugar — exposto como a vida em casa, acessível e discreto porque foi nessa discrição, e na penumbra do tempo lento que a envolve, que aconteceu a indagação da concordância entre os autores e os lugares, os lugares e as obras, as obras e os autores, os autores e os autores, Pedro Saraiva entre eles.
O que se resgata nessa concordância é a desinteressada curiosidade pelos espaços onde a memória que se fixa nas palavras e nas imagens remete para as coisas e para os processos que activam a ficção do quotidiano. E o que ela precipita, na surpreendente escassez de meios de que dispôs, é o entendimento do gabinete e do atelier — e da exposição em que se materializam — como reserva mental, localidade sem localização fixa, sistema e depósito do que permanece dos encontros que se inventam e se revelam no sumário do saber circular do mundo, encenado na visão total própria dos panoramas, ela mesma ficcionada na espiral em abismo dos loops por fechar que, na vertigem das fugas barrocas, rodopiam a caminho da sua eternidade.
[Maria João Gamito]

Um, Dois e Muitos I Marta Wengorovius



Um, Dois e Muitos
Marta Wengorovius

Textos de Sofia Marçal, Paulo Pires do Vale, Marta Wengorovius e Maria João Mayer Branco

ISBN 978-989-9006-22-5 | EAN 9789899006225

Edição: Junho de 2020
Preço: 22,64 euros | PVP: 24 euros
Formato: 20 x 27 cm (brochado, com badanas)
Número de páginas: 192 (a cores)

Com a Fundação Carmona e Costa
Edição bilingue: português-inglês




Marta Wengorovius: «Um, Dois e Muitos é uma intuição de que existem três tipos de relações fundamentais: a relação consigo, com o outro, com os outros.»


Nesta exposição reúnem-se obras que Marta Wengorovius realizou desde 2012, numa investigação continuada em redor da questão da atenção, da orientação e do mapeamento. Usando meios muito diferentes, a artista remete para uma frase-conceito que pode servir como chave hermenêutica da sua obra: «Um, Dois e Muitos». Esta expressão permite compreender três regimes distintos de relação entre os elementos constituintes do mundo, o nosso horizonte de possibilidades: o indivíduo, o par e a comunidade, nas suas múltiplas declinações, da célula ao cosmos.
Os mapas, partituras ou instruções de uso que aqui se mostram propõem uma activação do espectador, também declinado enquanto «um, dois e muitos». A sua participação é determinante para a existência da obra — ela existe aí, quando o torna capaz: de sentir, de pensar, de agir. São propostas de exercício, tanto materiais quanto espirituais, para descobrir a capacidade de concentração, o conhecimento da natureza e as potencialidades do corpo: em movimento ou parado, dançando ou desenhando, no território ou no plano da folha. O palco é nosso. Em vez de nos deixar de fora e pretensamente seguros na margem, exige que nos lancemos à água.
Aqui, a redesenhar o horizonte em que nos movemos, a obra está em obra
[Paulo Pires do Vale]



Um, Dois e Muitos é uma intuição de que existem três tipos de relações fundamentais: a relação consigo, com o outro, com os outros. Como artista interessou-me trabalhar esta intuição. […]
A pouco e pouco, fui-me apercebendo de que Um, Dois e Muitos era uma ferramenta, um método, um caminho que podemos aplicar a qualquer disciplina. Como artista fui observando como se desenha esse movimento e como ele está presente em todos e em tudo, e como, porque cria espaço, nos pode orientar. Este movimento acontece pela acentuação alternada no Um, no Dois ou no Muitos. Esta ferramenta é uma forma de acordar, de trazer ao de cima — como aqueles líquidos que se colocam nas experiências científicas e que ao tomarem diferentes cores nos permitem ver melhor. E ao fazê-lo criam espaço (a ideia da arte é sempre de criar espaço) e dão-nos a hipótese de desenhar melhor o que queremos acentuar. 
A série de obras do Um, Dois e Muitos são possibilidades de vivermos esse movimento. 
[Marta Wengorovius]

Mare Aethiopicum I Paulo Quintas


Mare Aethiopicum
Paulo Quintas

Texto de Carlos Vidal
Design de António Lobo

ISBN 978-989-9006-34-8 | EAN 9789899006348

Edição: Junho de 2020
Preço: 16,98 euros | PVP: 18 euros
Formato: 19,5 x 24,8 cm (brochado)
Número de páginas: 72 (a cores)

Com a GIEFARTE
Edição bilingue: português-inglês



O pintor faz a pintura que parece que se faz a si mesma. Faz com que ela se faça.


Este catálogo foi publicado por ocasião da exposição Mare Æthiopicum, de Paulo Quintas, realizada na Giefarte entre 7 de Março de 2020 e 6 de Junho 2020.


Depois da sua muito extensa e indispensável (heterodoxa!) antológica, Todos os Títulos estão Errados, na Cordoaria, Paulo Quintas expôs […] novos trabalhos que desenvolviam pressupostos de sempre; estes trabalhos, outros trabalhos, talvez todos um pouco mais do que pinturas, também espaços, geografias de imagens, «rotas marítimas» imprevisíveis ou descobertas; sintetizaria assim: há sempre muito pouco que ver, ou que «alimente» a visão, na pintura do autor. Digamos de outro modo, creio e estou mesmo certo de que só há um tema na pintura de Paulo Quintas: a amostragem ou revelação do seu processo. E, ao mesmo tempo, só há um tema não mostrado nem revelado nesta pintura: precisamente a exibição ou revelação do seu processo. […]
O pintor faz a pintura que parece que se faz a si mesma. Faz com que ela se faça. Logo, faz (um pouco de) tudo, e quanto mais simples é o processo menos a pintura se «faz» — e Paulo Quintas aprecia «fazer pouco» e escolher procedimentos básicos. Aliás, se a pintura se faz como a volta do «mar largo» o pintor não faz praticamente nada. Certo e errado. […]
O círculo, sem princípio nem fim, forma peculiar, portanto, faz esta pintura circular em torno de si mesma. E, no final, revela-se camada inédita, imprevisível. Mas um imprevisível escolhido entre muitos e muitas hipóteses. O pintor escolhe um tipo de imprevisibilidade. A escolha certa: escolher as modalidades da perda. Cada tela é uma «tela certa» com título «errado». É uma afirmação sólida e desfeita pela vontade do pintor. A matéria apaga-se. Fica a forma. Exacta. No final desaparece a hesitação. Nunca há hesitação.
[Carlos Vidal]

Ensaio sobre a Pirataria Digital I Jorge Vieira



Ensaio sobre a Pirataria Digital
Jorge Vieira

ISBN 978-989-9006-04-1 | EAN 9789899006041

Edição: Maio de 2020
Preço: 14,15 euros | PVP: 15 euros
Formato: 16 x 22 cm (brochado, com badanas)
Número de páginas: 216

Com a SOPCOM



A pirataria como um importante meio informal de mediação e circulação de cultura.


A chamada pirataria digital constitui actualmente uma prática, na internet, desenvolvida à escala global e de forma quotidiana. Contudo, apesar desta normalização, encontra-se envolta em acesas discussões, sendo enquadrada como um comportamento desviante, ilegal e com impactos negativos nas indústrias assentes em direitos autorais.
Enraizado numa sociologia da mediação e nas ciências da comunicação, este livro propõe uma interrogação crítica às perspectivas hegemónicas sobre este fenómeno. Como alternativa, encara-se a pirataria como um importante meio informal de mediação e circulação de cultura, ao permitir o acesso não autorizado a uma gigante biblioteca de conteúdos de media e recursos digitais informacionais.

Jorge Vieira nasceu no Porto e é Professor Auxiliar no ISCTE – Instituto Universitário de Lisboa. É doutorado em Sociologia, mestre em Comunicação, Cultura e Tecnologias de Informação e licenciado em Sociologia. Para além da docência desenvolve investigação no Centro de Investigação e Estudos de Sociologia (CIES-IUL) e no OberCom – Observatório da Comunicação enquanto investigador integrado. Media e cultura, e a forma como se interligam, são as suas principais áreas de interesse.

sábado, 18 de julho de 2020

«Ensaio sobre uma apresentação quase proferida — A invasão do Eterno!» I João Paulo Costa

Mirones, Mantra 3 (det.), 2009 


«[…]
Tinha preparado uma meditação longa para este banquete convivial! Mas tive um sonho esta noite que revolveu o que estava programado. Um sonho disruptivo – como são os gestos, as palavras ou silêncios poéticos – em tempos de “festa da insignificância” (Milan Kundera) ou como diria o pensador Cornelius Castoriadis de “ascensão da insignificância”. Bem, mas este sonho deu 30 páginas de história! Não, não muitas… Mesmo se esse sonho por agora possa ser apenas distópico, fora do lugar, e precisamente por isso ele poderá ser só germinal ou inaugural de qualquer coisa, que não de si próprio, proponho-vos que façamos uma viagem no tempo deste sonho. Ao século VII-VIII da nossa era, à bela moçárabe Andaluzia (Alhambra, Córdoba ou Sevilha) ou até mais para trás, remontando ao tempo da cultura grega passando pela aventura monástica cristã. Quiçá este sonho possa ser um modo de resistência. E que sonho ou visão foi essa, que sem ser épica, é como uma fulguração que levanta as ondas do mar, como quando vemos as figuras marinhas de um filme americano a emergir do fundo do abismo? Deixo a narração completa desse sonho para um outro momento, para ouvirmos agora o Eduardo Jorge e o Carlos Poças Falcão, dois amigos e criativos de excelência que muito estimo, pela fecundidade do seu trabalho, e pelas conversas e diálogos que fomos tendo ao longo destes tempos. A eles o meu profundo agradecimento por terem anuído a participar neste banquete da palavra e da amizade. A nós todos por termos ousado sair do confinamento interior ou do silêncio solitário para a presença pública, ainda que só por breves momentos, mas que ela nos possa entusiasmar e estimular a ir mais além dos consensos de ocasião, a pensar e a imaginar o impensado.

A Babel do fragmento

Depois de publicado, na verdade, olho para este ensaio como uma Babel ou então como uma pequena biblioteca onde habitam diversos géneros literários ao qual diversos públicos podem aceder, certamente com diferentes níveis de entendimento. O interlúdio é talvez a parte mais acessível para o comum dos leitores, mais teológico, na medida em que se desenha aí a possibilidade de uma cristologia sapiencial ao estilo do Nazareno. Uma grande parte das figuras do livro, desde autores a artistas, são figuras sombra, quer dizer, que de um ou outro modo habitam o mundo, o tempo e o espaço à sombra do Invisível, que deixaram tudo em aberto para a perceção silenciosa e discreta do mistério do Ser que vem compassadamente ou por eclosão ou deflagração aos nossos passos errantes. Não me interessa nada um pensamento edificante ou instrutivo como começo das coisas, mas fazer ouvir, fazer ver, fazer sentir algo novo que emerge de um fundo imemorial, de um mistério de invisibilidade no contacto coma realidade visível, e não fora dela, o que seria ilusionismo ou devoção ao irracional. O mistério ou natureza das coisas, que sempre uma ordem estranha, no dizer de António Damásio, só se colhe em contacto com a realidade, e a realidade só se descobre no contacto com o mistério. Que depois deste encontro ou contacto primordial e silencioso se encontre consolação, encorajamento, medo, alegria, edificação ou desassossego numa obra isso é a inteligência da mente a abrir-se para um outro nível de confluências. Primeiro é precisar habitar poeticamente o mistério do visível. Flannery O’Connor fala de uma «invasão do eterno». A propósito dos vestígios do passado que nos chegam em fragmentos, vale a pena atender ao texto de José Mattoso: «Mas, uma vez vivido o sagrado, os fragmentos que o materializam não cessam mais de desafiar o desejo. Chamam-nos para mostrar aspetos novos da sua mensagem e convidam-nos a sentir a sua unidade. As obras de Ilda David, expostas com as Bíblias medievais, representam uma ressonância contemporânea, concreta, igualmente palpável, como os próprios códices, da mensagem divina, mediante a leitura que ela fez. Convidam-nos a experimentar o nosso «silêncio de leitura», ou seja, a deixar que a semente do verbo interior frutifique em imagens ou sons, e, por meio deles, alimente a nossa comunhão com Deus.»
[…]


João Paulo Costa 
Livraria Centésima Página, Braga, 6 de Julho de 2020


sexta-feira, 10 de julho de 2020

João Lopes recomenda…



Crítico João Lopes recomenda
Descasco as Imagens e Entrego-as na Boca — Lições António Reis
Nas suas palavras [clicar na imagem e ver e ouvir a partir dos 2 minutos e 47 segundos],
«um pequeno grande acontecimento relacionado com o cinema português».

[ mais informação sobre este livro ]