Do Álbum Que Me Coube em Sorte — O Cinema
como Metamorfose da Experiência Interior
José Bogalheiro
Na origem de semelhante empreendimento encontra-se, naturalmente, essa modalidade da experiência a que, na sua singular forma de ocupação criativa do tempo, o espectador se entrega ao ver um filme, confiante na satisfação que a animação da «hora e meia de solidão especulativa» traz consigo e que as subsequentes investigações mais ou menos subterrâneas prometem acrescentar.
Os textos que agora se reúnem em livro foram originalmente publicados, com periodicidade mensal, a partir de Novembro de 2021, no site de cinefilia À Pala de Walsh, sob a forma de crónicas cujo sopro inicial partiu de versos de António Franco Alexandre — «E falta-me esta imagem para ter / inteiro o álbum que me coube em sorte» —, nos quais surgiu o motivo para o título da série. […]
A presente edição, adoptando o título Do Álbum Que Me Coube em Sorte da segunda série de crónicas e mantendo a remissão para o cinema como metamorfose da experiência interior, que o subtítulo do livro conserva, retoma, com as correcções trazidas pela revisão, os textos que se projectaram como uma variação da afirmação de Guido Ceronetti segundo a qual «a mulher é imagem», que Maria Filomena Molder me assinalara, sendo que, considerado o resultado da metamorfose propiciada por essa experiência de espectador de cinema, o que acabou por ser trazido à superfície — a bem dizer, a esse ecrã em que as imagens se sustêm de forma cristalizada, irredutivelmente fragmentária — são presenças reais, que se impõem ao amor de um fetichista, que os versos de António Franco Alexandre me induziram a tomar por imagens do álbum que me coube em sorte.
[José Bogalheiro]
Sem comentários:
Enviar um comentário