Salomé, Salomés…
Gustave Flaubert, Oscar Wilde, Guillaume Apollinaire e ainda
Mário de Sá-Carneiro, Eugénio de Castro, Fernando Pessoa
A esterilidade do desejo; a neta de Herodes o Grande que Mateus pôs a dançar no seu capítulo 14 e uma imaginativa tradição enfeitou até à deusa da histeria e ao superlativo exemplo da sedução sangrenta.
Esta edição reúne textos em prosa de Gustave Flaubert, Oscar Wilde e Guillaume Apollinaire que cumprem, ao serem postos por esta ordem, uma aceitável sucessão cronológica nas suas narrativas. Flaubert demora-se nas horas que precedem o festim onde Salomé executa a dança premiada com a decapitação do Baptista, escolhendo embora como centro da intriga a sua mãe Herodíade, e fazendo de Salomé não mais do que o seu prolongamento físico, capaz de reacender no decrépito Herodes Antipas a maléfica memória da sua já morta paixão; Oscar Wilde escolhe para o seu texto teatral esse mesmo festim, fazendo Salomé perecer por decisão de um Herodes profundamente chocado com o acto que a palavra de tetrarca obrigou a consumar; Apollinaire imagina Salomé depois da sua dança, imagina-a levada para fora da Judeia por um procônsul romano, e destina-a a um final irónico onde a sua cabeça morta parece repetir visualmente o que ela própria impôs ao profeta que a não quis amar.
[…]
A este conjunto foram ainda associados três textos portugueses, de Mário de Sá-Carneiro, Eugénio de Castro e Fernando Pessoa, que em tempos muito impressionados por orientalismos trouxeram às letras portuguesas a perversa bailarina dos Evangelhos. Nem o soneto de Sá-Carneiro nem o poema de Eugénio de Castro podem considerar-se momentos altos entre os que tiveram a figura de Salomé como centro; e os fragmentos de Fernando Pessoa deixam em aberto todas as hipóteses sobre a qualidade do texto como matéria verbal destinada a uma representação dramática.
[Aníbal Fernandes]
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