De Natura
Cristina Ataíde
Doris von Drathen: «Ataíde conhece várias formas de jogar com a sua arte e a natureza: por um lado, encontra na natureza pedras, paus, torrões de argila onde reconhece esculturas a que dá visibilidade; por outro, pode pintar com o Riotinto, depois de lhe misturar pigmentos na sua corrente.»
Imaginei um encontro entre Bill Viola e Cristina Ataíde (inesperado será só para aqueles que não sabem esperar).
Primeira cena. Ele falaria daquilo que tem aprendido com os seus vídeos. «E o que é?» pergunta ela. Responde ele, «Que ultrapassa aquilo que é suficiente para continuar a fazê-los.» «E, então?» insiste ela. «É que o vídeo é só um instrumento...» Ela interrompe: «Para ver qualquer coisa sobre a vida e sobre ti próprio?» «É isso.»
Segunda cena. É ainda ele que começa: «Imagina o que descobri nas minhas leituras sobre o funcionamento do cérebro.» «Sim, é apaixonante e surpreendente», concorda ela, adiantando-se-lhe já. «É que,» continua ele, «todos os neurónios estão desligados uns dos outros, começando e terminando com um pequeníssimo quiasma de espaço vazio.» E ela comenta: «Qualquer coisa de imprevisível, não é? O nosso cérebro a ajudar-nos a abrir finíssimas brechas entre as nossas convicções, que se costumam agarrar umas às outras, formando uma pasta agreste.» «Sim», concorda ele, acrescentando: «Todos os nossos pensamentos têm no seu cerne esta pequena estampagem de nada.» Ela promete entusiasmada: «Vou já oferecer-te o meu óculo.»
[Maria Filomena Molder]
Querida Cristina
Os meses passaram, o sol brilhou e a chuva deixou-nos em silêncio, as viagens sucederam-se, também os trabalhos e as alegrias e as dores e as imagens que se evaporam no ar, à nossa frente… em todo este tempo o maravilhoso livrinho que me ofereceste não parou de me observar, de me esperar, de me acompanhar (sempre dentro de mim). O teu gesto, tão bonito e tão cheio de significado, deixou-me sem palavras, surpreso por existirem pessoas como tu que, neste mundo já tão pouco rigoroso, seguem o rigor cristalino do seu coração, assim, sem medo nem inquietação. Encontramo-nos poucas vezes mas tenho sempre a impressão de que nos acompanhamos há anos, na distância. Essa beleza não a quero perder! […]
Tens razão, tudo são trocas, entre nós, os homens que pensamos com a alma.
[Rui Chafes]
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