quarta-feira, 6 de março de 2013

«Com Roth, aprende-se mais sobre religião do que em qualquer catequese...»


Joseph Roth
Judeus Errantes
Sistema Solar
Tradução de Álvaro Gonçalves

Publicado pela primeira vez em 1927, quando as almas mais atentas já começavam a perceber que os nacional-socialismo alemão havia de transformar a Europa em escombros e as mais benevolentes achavam que estava tudo bem, Judeus Errantes é um ensaio elogioso sobre os judeus orientais, evoluindo do elogio para a reflexão sobre a identidade judaica, a religião e o anti-semitismo.

No seu modo magistral de usar a escrita como processo de pensamento, cruzando histórias e episódios com uma imensa erudição sobre o tema a que se dedica, Joseph Roth desfia a eterna epopeia judaica a partir dos contextos que conhece por experiência própria (a Europa Central, sobretudo) e das conversas que vai tendo e recolhendo com judeus de Viena, Berlim, Paris, muitos vindos da Rússia, da região da Galicia, dos vários torrões espalhados pela queda do império Austro-Húngaro, e muitos procurando maneiras de chegar ao Ocidente, em particular aos Estados Unidos da América. A forma como descreve a relação dos judeus com a religião é tão comovente como marcada pelo humor, aquele tipo de humor contido e inteligente que reservamos para aquilo que mais respeitamos. Pelo contrário, a referência ao sionismo é implacável, separando as águas entre identidade e nacionalismo. Com Roth, aprende-se mais sobre religião do que em qualquer catequese, mais sobre o conflito israelo-palestiniano do que em horas de visionamento televisivo das notícias e mais sobre a natureza humana do que em muitos romances aspirantes a universais.

Sara Figueiredo Costa
[publicado na Time Out, Fev. 2013 e no Cadeirão Voltaire]

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