Design gráfico de Horácio Frutuoso
ISBN 978-989-8833-90-7 | EAN 9789898833907
Edição: Abril de 2022
Preço: 15,09 euros | PVP: 16 euros
Formato: 17 x 24 cm (brochado)
Número de páginas: 208
Com o Teatro Praga (colecção «Sequência»)
O teatro e a literatura são diferentes porque são duas coisas, duas pessoas. À partida não
há qualquer distância entre as duas artes, tal como não há entre uma viagem de barco
pelo Amazonas e uma equação física ou entre a cidadania e uma pintura da Idade Média.
As distâncias são fruto de uma proposta de relação que, como tentei demonstrar, alimenta frustrações e imobiliza identidades. O que proponho implica reconhecer o outro no encontro e identificar o óbvio: eu não sou tu. A diferença deixa de ser
eterna e constante, passa a ser negociável, mutável e não dependente da semelhança. Acontece a cada momento, comportando
simultaneamente o que é conhecido, as histórias e as certezas. Nisto participa no jogo da existência, no mundo em movimento.
Não há, à partida, qualquer contradição entre o teatro e a literatura, não existe qualquer oposição, dissociação ou diferença, nem qualquer relação necessária. O reconhecimento da separação e da intransponibilidade, o facto de eu não ser tu ou de
uma pessoa não ser outra permite um pensamento mais livre sobre o teatro e a literatura porque não estaremos condicionados
por um só tipo de relação, nem por um conhecimento exclusivo da disciplina; escaparemos, tanto quanto possível, a uma
autoridade que precede e limita o objeto.
A inexistência de uma solução para o problema da relação entre o teatro e a literatura conforme ele é apresentado ao
longo dos tempos por diferentes histórias do teatro, autores teatrais e dramáticos, bem como críticos ou académicos, deve-se
à própria formulação do problema. Ao reformular o problema, deixamos de estar dependentes de uma descrição epistemológica de cariz dualista que segue em busca de uma solução para as dúvidas e colocamo-nos dentro de um quadro de aceitação
ou de reconhecimento de uma ontologia própria e escandalosa, abrindo
esta relação ao quotidiano. É por isso que não devemos negligenciar o papel
da vontade nesta equação. As descrições antiliterárias, pós-dramáticas
ou a defesa do teatro literário insistem, porque é a sua vontade, em tornar
compreensíveis e iluminar o que observam.
Para complementar a afirmação de que uma coisa não é outra coisa é
necessário então uma disponibilidade ou vontade própria do observador.
Depois de descrições várias de teatro e da sua relação com a literatura,
concluirei com o modo como o reconhecimento da vontade e um outro
conceito de conhecimento podem afetar as descrições de espetáculos e
literatura dramática, o olhar do leitor e do espectador e a relação deste
com a obra que lê ou vê. Isto porque, mais do que abrir possibilidades e
significados para o teatro e literatura, me interessa reconhecer outros pares,
de que espetáculo e espectador são exemplos, capturados por uma lógica
antinómica que limita significados.
[José Maria Vieira Mendes]
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