Artur Guerra, por Cristina Rodriguez (2018) |
O tradutor português Artur Guerra* acaba de ser distinguido com o Prémio Ramon Llull de Tradução Literária pela tradução, do original catalão para português, de Tirant lo Blanc, de Joanot Martorell. A edição é da Documenta, chancela da editora Sistema Solar.
Este prémio visa reconhecer a importância do trabalho dos tradutores literários e premeia a melhor tradução literária, do catalão para outras línguas, editada no ano anterior.
O júri, escolhido pela Fundação Ramon Llull, foi constituído por quatro membros de reconhecido mérito no mundo da tradução literária: Francesc Parcerisas, poeta, professor, tradutor e crítico literário (presidente do júri); Montserrat Camps, doutora em Filologia Clássica e professora de Filologia Grega na Universidade de Barcelona; Anna Casassas, licenciada em Direito e tradutora; Monika Zgustová, escritora e tradutora.
O prémio foi outorgado, não só pela tradução de Tirant lo Blanc, mas também pela trajectória de Artur Guerra como tradutor.
Tirant lo Blanc é uma obra central da literatura catalã, escrita no século XV e dedicada «ao sereníssimo Príncipe Dom Fernando de Portugal […] mui excelente, virtuoso e glorioso Príncipe, Rei expectante», mas também da literatura europeia e universal, constituindo-se como uma obra seminal do romance moderno e estava, por isso, há muito identificada como uma obra que não podia deixar de ser traduzida para português. Estava identificada a obra e o tradutor, alguém que é conhecido e reconhecido como o mais competente de entre os nossos tradutores para verter «o livro do valeroso e intrépido cavaleiro Tirant lo Blanc, Príncipe e César do Império Grego de Constantinopla, o qual foi traduzido do inglês para a língua portuguesa, e depois para a língua vulgar valenciana, pelo magnífico e virtuoso cavaleiro mossèn Joanot Martorell» — conforme reza o Deo Gratias de Tirant lo Blanc — novamente para português.
Sobre a obra, em D. Quixote de la Mancha, parte I, capítulo VI, diz-nos Miguel de Cervantes:
«— Valha-me Deus! — disse o cura, soltando um grande brado —, que aqui está o Tirant lo Blanc! Dai-mo cá, compadre, que eu agirei como quem encontrou nele um tesouro de contentamento e uma mina de passatempos. Aqui está Dom Kirieleison de Muntalbà, valoroso cavaleiro, o seu irmão Tomás de Muntalbà, e o cavaleiro Fonseca, com a batalha que o valente Tirant fez com o alão, e as subtilezas da donzela Prazerdaminhavida, com os amores e artimanhas da viúva Repousada, e a senhora Imperatriz enamorada de Hipólito, seu escudeiro. A verdade vos digo, senhor compadre, que em razão de estilo não há no mundo livro melhor: aqui os cavaleiros comem e dormem, morrem nas suas camas e fazem testamento antes de morrer, com outras coisas mais que faltam em todos os livros deste género. […] Levai-o para casa e lede-o, e vereis que é verdade tudo o que dele eu vos disse.»
A edição portuguesa vem enriquecida com notas, também de Artur Guerra, e desenhos e xilogravuras da pintora Ilda David’ — dando o tom e o ambiente certos à leitura de Tirant lo Blanc, agora vertido do catalão para a língua de Camões —, numa escolha editorial que visou oferecer aos nossos leitores uma edição que perdure para além do tempo da leitura.
* Artur Guerra nasceu em Silvã de Cima (Sátão, Viseu) no dia 23 de Dezembro de 1949. Vive na Margem Sul do Tejo, no concelho do Seixal.
É licenciado em Filosofia pela Universidade de São Tomás, em Roma, e pela Universidade Clássica de Lisboa. Formou-se em Teologia em Valência, Espanha. Foi professor de Filosofia e de Psicologia do ensino secundário e desempenhou funções de professor bibliotecário, estando actualmente aposentado.
É tradutor freelance de castelhano, italiano e catalão desde 1983. Entre muitos outros, traduziu: José Ortega y Gassett, A Rebelião das Massas (Círculo de Leitores e Relógio D'Água, 1989); Miguel de Unamuno, Do Sentimento Trágico da Vida (Círculo de Leitores, 1989) e A Agonia do Cristianismo (Livros Cotovia, 1991); Miguel Delibes, Os Santos Inocentes (Teorema, 1991); Carlo Coccioli, Buda e o seu glorioso mundo (Livros Cotovia, 1992); Maria Zambrano, Os Sonhos e o Tempo (Relógio D'Água, 1994) e O Homem e o Divino (Relógio D'Água, 1995); Daniel Innerarity, A Filosofia como uma das Belas Artes (Teorema, 1996)
Do catalão, traduziu os seguintes autores: Joan Perucho, As Histórias Naturais (Teorema, 1990); Ramon Llull, Livro da Ordem de Cavalaria (Assírio & Alvim, 1992); Jesus Moncada, Caminho de Sirga (Dom Quixote, 1992); Mercè Rodoreda, Espelho Partido (ASA, 1992) e A Morte e a Primavera (Relógio D’Água, 1992); Maria Barbal, Cânfora (DIFEL, 1997) e Seixo Rolado (DIFEL, 2000); Antoni Tàpies, A Prática da Arte (Livros Cotovia, 2002); Marc Pastor, A Mulher Má, (TopSeller, 2014); Tina Vallès, A Memória da Árvore, (Dom Quixote, 2018); Joanot Martorell, Tirant lo Blanc (Documenta, 1º volume, 2015; 2º volume, 2017; 3º volume, 2018).
Em 2011, foi distinguido, conjuntamente com Cristina Rodriguez, com o Prémio de Literatura Casa da América Latina pela tradução de 2666 (Quetzal, 2010), romance póstumo do escritor chileno Roberto Bolaño.
Em 2018, é distinguido com o Prémio Ramon Llull de Tradução — da Fundação Ramon Llul — pela tradução de Tirant lo Blanc, de Joanot Martorell (Documenta, 3 volumes, 2015, 2017, 2018), e pela sua trajectória como tradutor.
Parabéns, Artur Guerra!
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